O presente texto faz parte de um trabalho, com três partes, de análise do regime legal do Alojamento Local em Portugal, bem como de ponderação acerca das recentes decisões judiciais e subsquentes alterações legislativas com impacto inegável numa atividade económica que tem ganho especial importância no território nacional, nomeadamente na Madeira e em concelhos como o do Funchal, Ponta do Sol e Calheta. O texto foi escrito por João Rodrigues, aluno da Escola de Direito da Universidade do Minho e que tem colaborado com a MB Advogados no âmbito de um estágio de verão.
“O presente texto debruçar-se-á sobre o Regime Jurídico do Alojamento Local e as alterações que foi alvo desde o seu aparecimento até às possíveis alterações nos dias de hoje. Primeiramente, cumpre delimitar concetualmente a figura do Alojamento Local que encontramos no Ordenamento Jurídico Português.
Assim, a figura do alojamento local foi criada pelo Decreto-Lei nº 39/2008, de 7 de março com a finalidade de enquadrar a prestação de serviços de alojamento temporário em estabelecimentos que não reunissem os requisitos legalmente exigidos para se qualificarem como empreendimentos turísticos. Contudo, justificando-se uma maior clareza e certeza jurídica desta figura a Portaria nº. 517/2008, de 25 de junho, entretanto alterada pela Portaria n.º 138/2012, de 14 de maio, que, no seguimento da transposição da Diretiva n.º 2006/123/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 12 de dezembro de 2006, pelo Decreto-Lei n.º 92/2010, de 26 de julho, veio consagrar a possibilidade de inscrição dos estabelecimentos de alojamento local através do Balcão Único Eletrónico.
Assim, a Portaria n.º 517/2008, de 25 de junho, veio prever três tipos de estabelecimentos de alojamento local, a saber, o apartamento, a moradia e os estabelecimentos de hospedagem, estabelecendo alguns requisitos mínimos de segurança e higiene. Com a referida Portaria procurou-se enquadrar uma série de realidades que ofereciam serviços de alojamento a turistas sem qualquer formalismo e à margem da lei, acautelando, ao mesmo tempo, que alguns dos empreendimentos extintos pelo Decreto-Lei n.º 39/2008, de 7 de março (nomeadamente, pensões, motéis, albergarias e estalagens) e que não reuniam condições para serem empreendimentos turísticos, pudessem ainda assim continuar a prestar serviços de alojamento, por forma a evitar o respetivo encerramento com todas as consequências negativas associadas. Sucede, no entanto, que a dinâmica do mercado da procura e oferta do alojamento fez surgir e proliferar um conjunto de novas realidades de alojamento que, sendo formalmente equiparáveis às previstas na Portaria n.º 517/2008, de 25 de junho, determinam, pela sua importância turística, pela confirmação de que se não tratam de um fenómeno passageiro e pela evidente relevância fiscal, uma atualização do regime aplicável ao alojamento local. Essa atualização, precisamente porque estas novas realidades surgem agora, não como um fenómeno residual, mas como um fenómeno consistente e global, passa, não só pela revisão do enquadramento que lhes é aplicável, mas, igualmente, pela criação de um regime jurídico próprio, que dê conta, precisamente, dessa circunstância.
Por isso mesmo, aliás, o Decreto-Lei n.º 15/2014, de 23 de janeiro, que procedeu à segunda alteração ao regime jurídico da instalação, exploração e funcionamento dos empreendimentos turísticos, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 39/2008, de 7 de março, que havia sido anteriormente alterado pelo Decreto-Lei n.º 228/2009, de 14 de setembro, assumiu a necessidade de autonomizar a figura do alojamento local em diploma próprio, de forma a melhor adaptar à realidade a ainda recente experiência desta figura no panorama da oferta de serviços de alojamento. É o que agora se faz com a aprovação do Decreto-Lei 128/2014, de 29 de agosto, o qual eleva a figura do alojamento local de categoria residual para categoria autónoma, reconhecendo a sua relevância turística e inaugurando um tratamento jurídico próprio.
Desta forma, as figuras dos empreendimentos turísticos e do alojamento local passam a ser duas figuras devidamente autónomas e recortadas, vedando-se a possibilidade de colocação sob a figura e regime do alojamento local de empreendimentos que cumprem com os requisitos dos empreendimentos turísticos. Esta autonomização pretende assim assegurar que a produtos distintos se aplicam regimes jurídicos distintos, tratando de forma igual o que é materialmente igual.”